terça-feira, 19 de outubro de 2010

SÚPLICA A SÃO JOÃO

Meu São João,
querido santo ambulante,
mas que demanda é essa
de deixar o outro falar?
Esse tal outro múltiplo que me trai
em desdicções sem compromisso,
por favor, meu santo, me escute:
que tenho eu com isso?..
Te peço arrego e aconchego.
Tropeço, só um ou outro
que é pra ninguém nos desconfiar.

Ai, meu São Joãozinho...
Não mais quero esse tal
que não me para de querer,
não cessa de me desejar
serpenteando pelas minhas costas
como quem pretende apunhalar.

Por favor, santinho meu,
se sou eu meu traidor,
posso até de ser me deixar, sei lá,
meu santo, só te suplico para deste fantasma me libertar...

Podes me chamar do que quiser:
medroso, recalcado, preguiçoso, ou até zé mané...
Um eu não meu é que não quero
a tornar intranqüilos meus sonhos,
meu sono, o meu ser de cardamomo .

Que venha minha morte parcial!
Assim talvez me veja eu livre
do tal erva - daninha que, por vacilo,
deixei que me invadisse o corpo
de umidade secreta e fluida...

sábado, 16 de outubro de 2010

SEM

Fumo a história enrolada em sentidos:
me alucina o perfume de magnólia
que flui pelo entreaberto da calma.

Fui-me indo despercebendo tudo
na velocidade que fazia lá fora.
Fui-me vendo por dentro
perambulando nu a cortar o vento.
Sem romance, sentido de século, sem eco.
Fui-me desfazendo em esquecimento...

Que letra é essa que me diz silêncio?

Quem é o silêncio que me grita a carne?

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

POEMA & POESIA

Outro dia minha avó me fez de avô cuspindo a seguinte interrogação:

- Meu neto, qualé a diferença da poesia pro poema?

Tirando de poeta, respondi:

- A poesia, vó, é a noiva de véu que sempre hesita pro poema poder continuar... Continuar esperando... Continuar buscando palavras, sejam elas florais ou minerais, para entregar à poesia. O poema e a poesia se completam na sua falta, na sua incompletude. Da angústia do poema se alimenta o encanto da poesia. Deste desencontro se nutri e se locomove minha poética.